Aumento da temperatura do oceano afeta ecossistemas na Costa das Algas (ES) 

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14 de março de 2022

Praia de Gramuté (ES). Comunidades tradicionais habitam a região da APA e dela dependem para garantir o sustento

As belezas da costa brasileira abrigam uma biodiversidade que está sendo diretamente ameaçada pelas mudanças climáticas. O aumento da temperatura do oceano está relacionado à ocorrência de eventos meteorológicos e oceanográficos extremos que impactam os ecossistemas em áreas de recifes, manguezais e estuários. Esta é a realidade identificada no litoral capixaba por pesquisadores do PELD Habitats Costeiros do Espírito Santo (HCES).

As pesquisas são desenvolvidas na Costa das Algas, região do litoral capixaba com grande diversidade de algas marinhas e ecossistemas costeiros. A área abriga Unidades de Preservação (UCs) criadas em 2010 pelo Governo Federal para proteger os habitats do local, abrangendo aproximadamente 25 km de litoral e 115 mil hectares de áreas marinhas protegidas. 

O PELD HCES/ES existe desde 2016, mas os primeiros estudos dos pesquisadores que integram o projeto começaram ainda em 2014. A iniciativa promove um monitoramento constante da região, permitindo a constituição de um banco de dados capaz de identificar os impactos da ação do homem e das mudanças climáticas na região, conforme explica o professor Ângelo Bernardino, vinculado à Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e coordenador do PELD HCES.

“A gente tem trabalhado para investigar efeitos de mudanças do clima ou eventos que se correlacionam como o clima, como mudanças de temperatura, de padrões de vento, de correntes oceânicas e como esses efeitos têm influência sobre a vida na Costa das Algas. É um dos poucos sítios costeiros no Brasil. Temos quatro anos de coleta de dados quase contínua. Já é uma das maiores séries de dados que a gente tem no Brasil para sistemas costeiros”, explica Bernardino.

A preocupação dos pesquisadores com o meio ambiente não está descolada de questões sociais, culturais e econômicas. Muitas comunidades tradicionais habitam a região de preservação da Costa das Algas e dela dependem para garantir o sustento e a manutenção dos hábitos de vida característicos de suas tradições, que vão desde a culinária à construção de embarcações tradicionais. 

“Muitos pescadores, vilas indígenas e grupos tradicionais usam esses recursos constantemente. E uma das coisas que a gente visa, além de estudar a parte científica das mudanças do clima, é ver como essas pessoas vão mudar a utilização desses recursos com o tempo. Será que esses recursos vão sofrer alguma pressão adicional do clima? É uma coisa que a gente precisa se preocupar, se a gente puder agir de alguma forma para prevenir esses efeitos. A ideia do projeto é tentar entender como o clima afeta aquela área e como a relação do homem com a natureza vai mudar ao longo do tempo”, explica Ângelo Bernardino. 

+ 1º C nas águas do mar e tempestades: redução dos recifes e manguezais

Os dados confirmam os impactos das mudanças climáticas na região. Os pesquisadores identificaram o aumento de médio de 1º C nas temperaturas mensais do mar na área da Costa das Algas. Pode parecer pouco, mas esse aquecimento interfere diretamente na dinâmica dos ecossistemas costeiros, afetando as populações de espécies marinhas e gerando alterações em seus habitats. 

Um exemplo disso é o que está ocorrendo nos recifes e manguezais. O monitoramento do PELD HCES identificou uma taxa de variação negativa de aproximadamente 40% nos recifes da região entre 2018 e 2020. Os recifes são formações rochosas e biogênicas, ou seja, produzidas por organismos vivos. São locais de alta biodiversidade e sensíveis às mudanças climáticas, que podem afetar diretamente os estoques pesqueiros na Costa das Águas.

As mudanças climáticas também estão relacionadas a eventos meteorológicos extremos que causam danos duradouros. De acordo com dados do PELD HCES mais de 10 hectares de florestas de manguezais morreram em decorrência de uma forte chuva de granizo ocorrida na região. Em todo o Brasil cerca de 20% da área de manguezal já foi perdida. 

Ao mesmo tempo em que são extremamente vulneráveis às mudanças climáticas, os manguezais também são fundamentais para a regulação do clima no planeta. Isso porque são eficientes sumidouros de carbono azul, ou seja, as absorções de dióxido de carbono nos manguezais são maiores do que as emissões. Além disso, os manguezais são fundamentais para a proteção da zona costeira. É o habitat de espécies importantes para o equilíbrio dos ecossistemas marinhos e para a economia das comunidades locais. 

Um resumo dos dados das pesquisas do PELD HCES está disponível em linguagem acessível e didática no e-book “Costas das Algas: habitats costeiros” disponível aqui

Leia também o artigo publicado pelo professor Angelo Bernardino na revista National Geographic (Brasil) sobre a importância da proteção dos manguezais clicando aqui.

Mangue Morto. Manguezais são eficientes sumidouros de carbono azul

Efeitos no bioma marinho-costeiro

A pesquisadora Ana Carolina Mazzuco, responsável pelo monitoramento da biodiversidade marinha no PELD-HCES, resume os efeitos das mudanças climáticas na área da Costa das Algas. “Os principais impactos no bioma marinho-costeiro detectados pelo PELD-HCES foram alterações na biodiversidade marinha, como por exemplo a redução da cobertura de algas marinhas e na comunidade de fauna associada e na dinâmica ecossistêmica, com a redução nos estoques de carbono de florestas de mangue”.

A redução nas populações das espécies afeta também atividades econômicas de subsistência, como a pesca, além dos impactos ambientais. “São esperados inúmeros impactos negativos decorrentes das alterações na biodiversidade e dinâmica ecossistêmica causadas pelas mudanças no clima, principalmente com a perda de serviços ecossistêmicos como redução da disponibilidade de habitat, da capacidade de provisão de alimento (pesca), e do potencial de proteção costeira”, explica a bióloga que possui doutorado em Oceanografia.

O PELD HCES realiza pesquisas multidisciplinares sobre os efeitos das mudanças climáticas em ambientes costeiros, com foco em sistemas recifais, bancos de rodolitos, estuários e manguezais. “Nossas pesquisas têm mostrado uma alta vulnerabilidade destes ambientes às condições meteorológicas e oceanográficas extremas como o aumento da temperatura do oceano e ocorrência de tempestades, que já causaram perdas significativas de biodiversidade e alterações de funções ecológicas”, conclui Mazzuco.

Existe solução?

A partir do diagnóstico proporcionado pela pesquisa é possível apresentar propostas de ações que contribuam para a preservação do equilíbrio ecológico na Costa das Algas, mitigando os efeitos das várias ameaças presentes na região. Além das mudanças climáticas, os ecossistemas costeiros sofrem ainda com a expansão portuária, a mineração marinha, a poluição urbana, a agricultura extensiva, o turismo de massa e a pesca predatória. 

Para enfrentar essas questões, os pesquisadores do PELD HCES defendem o incentivo à gestão eficiente, a ordenação dos usos e o cumprimento das leis ambientais, permitindo assim a conservação da biodiversidade a partir de um manejo sustentável dos recursos naturais. “Fortalecer as ações de conservação poderia auxiliar na mitigação dos impactos das mudanças climáticas nestes ecossistemas costeiros, pois se espera que áreas mais preservadas tenham maior poder de resiliência frente aos impactos do clima”, alerta Ana Carolina Mazzuco.

A continuidade das pesquisas de longa duração também é importante para o enfrentamento das questões geradas pelas mudanças climáticas. “A manutenção dos monitoramentos costeiros é fundamental para melhorar nossa capacidade de prever mudanças nos ecossistemas e orientar ações de manejo e recuperação frente aos cenários climáticos atuais e futuros”, alerta a pesquisadora do PELD HCES.

Enfrentamento das questões exige a continuidade das pesquisas de longa duração

Comunicação e conscientização

Para estimular boas práticas de conservação da natureza e promover a divulgação dos resultados já alcançados pelas pesquisas, o PELD HCES produziu a websérie “Costa das Algas”. São 4 episódios de vídeos documentais com duração entre 10 e 14 minutos cada, publicados no Canal Oficial do projeto no Youtube (inserir o link na expressão “canal oficial”: https://www.youtube.com/channel/UCRvhXrZtVFB0AXcwQ38LH1Q). Os vídeos e demais dados da iniciativa estão disponíveis no site oficial da websérie: www.costadasalgas.com.br.

O projeto foi desenvolvido com o apoio da Lei Aldir Blanc-ES, da Secretaria de Cultura do Governo do Estado do Espírito Santo e da Secretaria Especial da Cultura do Ministério do Turismo, além de entidades de fomento como CNPq, Capes e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Espírito Santo (FAPES), Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que financiam as pesquisas do PELD HCES.  

A série discute temas como as belezas, povos e tradições da Costa das Algas (episódio 1), os impactos e ameaças à natureza (episódio 2), e ciência de conservação e o trabalho das pesquisas ecológicas de longa duração (episódio 3) e a cultura oceânica e os caminhos para convivência harmônica entre sociedade e natureza (episódio 4). Confira a seguir o episódio que trata diretamente das mudanças climáticas.

Ação Sensibilização sobre as mudanças climáticas
Texto: Rostand Melo (UEPB)
Fotos: Thiago Cruz – Acervo PELD HCES/ES
Com informações de: Ana Carolina Mazzuco (PELD HCSE)
Instagram: https://www.instagram.com/peld.hces/
Youtube: https://www.youtube.com/channel/UCRvhXrZtVFB0AXcwQ38LH1Q

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